domingo, 14 de fevereiro de 2010

Namorar com a vida...


Quando imaginei escrever este texto hoje, estava uma fabulosa tarde de chuva, sim fabulosa, leram bem! (Daquelas tardes convidativas a ficarmos aconchegados, com uma mantinha, no sofá, a ler um bom livro.) E com a mesma surpresa com que leram isto, senti-me surpreendida ao lembrar-me que dia era... Por entre a folia do Carnaval, quase que me passava ao lado. (Leia-se que eu detesto o Carnaval!) Hoje é o tal dia em que supostamente somos o melhor do mundo para alguém... e sê-lo não nos impede de cometermos alguns erros, talvez até incentive, por acreditarmos que o "outro" estará sempre do nosso lado "no matter what...!"
Decidi sentar-me e divagar um pouco acerca deste e outros assuntos…
Nunca ninguém cresce de uma forma idílica... e ao vasculharmos o baú, que é a nossa memória, encontramos, seguramente, momentos em que crescer doeu, e doeu tanto que nos tornamos descrentes dos sentimentos, dos outros e até de nós mesmos.
Com o dia-a-dia a desafiar-me a crescer e sentindo esse progresso dentro de mim, acabei por perceber que viver pode tomar outros rumos, abranger outras dimensões.
Continuo a acreditar que algumas pessoas podem ser o nosso paraíso e que para tirarmos proveito disso, basta, simplesmente, ir na direcção que o nosso coração insista em escolher... Mas cuidado, porque aquilo que acabamos por descobrir é apenas tudo o que o amor não é!
Nem sempre o Amor é o percurso seguro que nos habituamos a fazer... O que devemos compreender, porém, é que não existem pessoas perfeitas, mas que isto não sirva para nos resignarmos a escolher qualquer um(a) que se apresente diante de nós! As pessoas têm de se esforçar por se tornarem seres humanos cada vez melhores!
Lembrem-se também que o essencial não é invisível, não acreditem que as pessoas podem mudar, porque simplesmente não mudam: what you see is what you get!
Acreditem nos afectos, construam-nos, vivam deles e para eles e deixem de ser pessoas mesquinhas! Os afectos, sejam eles quais forem, são o verdadeiro tempero da vida, sem eles tornamo-nos em seres insossos. Os afectos servem para que o sol também brilhe dentro de nós e não apenas lá fora onde ele tenta a todo o custo fazer-se ver por entre as nuvens... namorem, mas namorem com a vida, acima de tudo!
Por vezes nem quero acreditar quando dou comigo a pensar que a maioria das pessoas está doente. Ultimamente, por razões que agora não importa dizer, tenho dado por mim a olhar para dentro... a colocar em dúvida todas as minhas opções, abraçando todos os meus erros, tentando resolvê-los e apercebendo-me, com tudo isto, que estou crescendo. Aprendi a olhar para mim mesma com a humildade de quem ainda não sabe tudo, de quem tem o direito de errar, mas que quer a todo o custo tornar-se num ser humano mais condescendente consigo próprio. Esta agitação interior não é de forma alguma incompatível com a tranquilidade, devo dizer-vos que nunca na minha vida questionei tanto e, contudo, sinto-me em paz comigo mesma, logo, em paz com os outros.
O meu pensamento voou, por momentos, para a quantidade de pessoas maldosas que existem por aí... sim, ser mau não é um instinto primário, nem sequer consta dos manuais de sobrevivência, somos maus quando ignoramos, com insistência, a consequência dos nossos actos... E não, não basta pedirmos desculpa a quem fazemos mal, estaríamos a sobrecarregar a pessoa que acolheu antes a nossa raiva com a nossa culpa. Coloquem a mão nas vossas consciências, é acerca desta temática que o dia de hoje deve insistir... não se vinguem da bondade que invejam nos outros.
... "e foram felizes para sempre", não é um prémio que se recebe pelo melhor argumento, também não é um jogo de sorte ou azar, é todo um percurso que se traça quando damos tudo o que somos e recebemos tudo o que o outro é... é sobreviver à fase do deslumbramento, é aceitar as imperfeições, mas é, acima de tudo, amarmo-nos a nós próprios antes de amar o outro.
Ser feliz não é impossível... mas ser feliz torna-se difícil quando se finge não ver todas as reticências que um Amor desperta... não se ganha a sorte grande quando nem sequer se joga na lotaria!
Ser namorado(a) não é apenas oferecer uma prenda a alguém... ser namorado(a) é ter o cuidado de não ir fechando as portas ao outro coração, para que não transformem esses "gestos de amor" numa eterna saudade do que antes era sol e que se poderá tornar, talvez, em escuridão e silêncio... "os laços também morrem, basta que se iludam os cuidados que um grande Amor precisa ter".
Existem pessoas para as quais eu já fui o Grande Amor das suas vidas, para outras, não passei de um mero capítulo. Eu também tive um Grande Amor da minha vida, outros apenas passaram pela minha vida para me ensinarem a crescer, a ver novos horizontes, a perceber que a vida não termina apenas porque um amor chega ao fim... A nossa memória nunca deita fora as pessoas pelas quais sentimos uma enorme gratidão, não quero afastar essas pessoas da minha cabeça, nem do meu coração, como se estivesse a impor uma penitência a mim própria... o que importa é que não deixemos de ambicionar que a relação que hoje é vivida valha mais do que tudo de bom de todas as relações que já vivemos... Todas as relações não têm de ser "Para Sempre"... Nunca chegamos à relação certa com um "mapa de tesouro", não existe uma fórmula secreta ou uma poção mágica para que a química aconteça... é mais um "Vai por ali!", pois o "nosso caminho é que nos descobre, sempre que passe por nós a descoberta do caminho de alguém"... Por elas e para elas deixo este texto de que gosto muito... e o meu sempre beijo doce!


ELOGIO AO AMOR …

“Quero fazer o elogio do amor puro.
Parece-me que já ninguém se apaixona de verdade.
Já ninguém quer viver um amor impossível.
Já ninguém aceita amar sem uma razão.
Hoje as pessoas apaixonam-se por uma questão de prática.
Porque dá jeito. Porque são colegas e estão ali mesmo ao lado.
Porque se dão bem e não se chateiam muito. Porque faz sentido. Porque é mais barato, por causa da casa. Por causa da cama. Por causa das cuecas e das calças e das contas da lavandaria.
Hoje em dia as pessoas fazem contratos pré-nupciais, discutem tudo de antemão, fazem planos e à mínima merdinha entram logo em "diálogo".
O amor passou a ser passível de ser combinado. Os amantes tornaram-se sócios.
Reúnem-se, discutem problemas, tomam decisões.
O amor transformou-se numa variante psico-sócio-bio-ecológica de camaradagem.
A paixão, que devia ser desmedida, é na medida do possível.
O amor tornou-se uma questão prática.
O resultado é que as pessoas, em vez de se apaixonarem de verdade, ficam "praticamente" apaixonadas.
Eu quero fazer o elogio do amor puro, do amor cego, do amor estúpido, do amor doente, do único amor verdadeiro que há, estou farto de conversas, farto de compreensões, farto de conveniências de serviço.
Nunca vi namorados tão embrutecidos, tão cobardes e tão comodistas como os de hoje.
Incapazes de um gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de ousadia, são uma raça de telefoneiros e capangas de cantina, malta do "tá tudo bem, tudo bem", tomadores de bicas, alcançadores de compromissos, bananóides, borra-botas, matadores do romance, romanticidas. Já ninguém se apaixona?
Já ninguém aceita a paixão pura, a saudade sem fim, a tristeza, o desequilíbrio, o medo, o susto, o amor, a doença que é como um cancro a comer-nos o coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo?
O amor é uma coisa, a vida é outra. O amor não é para ser uma ajudinha.
Não é para ser o alívio, o repouso, o intervalo, a pancadinha nas costas, a pausa que refresca, o pronto-socorro da tortuosa estrada da vida, o nosso "dá lá um jeitinho sentimental".
Odeio esta mania contemporânea por sopas e descanso. Odeio os novos casalinhos. Para onde quer que se olhe, já não se vê romance, gritaria, maluquice, facada, abraços, flores.
O amor fechou a loja. Foi trespassada ao pessoal da pantufa e da serenidade. Amor é amor.
É essa beleza. É esse perigo. O nosso amor não é para nos compreender, não é para nos ajudar, não é para nos fazer felizes. Tanto pode como não pode. Tanto faz. É uma questão de azar.
O nosso amor não é para nos amar, para nos levar de repente ao céu, a tempo ainda de apanhar um bocadinho de inferno aberto.
O amor é uma coisa, a vida é outra. A vida às vezes mata o amor.
A "vidinha" é uma convivência assassina. O amor puro não é um meio, não é um fim, não é um princípio, não é um destino. O amor puro é uma condição. Tem tanto a ver com a vida de cada um como o clima. O amor não se percebe. Não dá para perceber. O amor é um estado de quem se sente. O amor é a nossa alma. É a nossa alma a desatar. A desatar a correr atrás do que não sabe, não apanha, não larga, não compreende. O amor é uma verdade. É por isso que a ilusão é necessária. A ilusão é bonita, não faz mal. Que se invente e minta e sonhe o que quiser. O amor é uma coisa, a vida é outra. A realidade pode matar, o amor é mais bonito que a vida. A vida que se lixe. Num momento, num olhar, o coração apanha-se para sempre. Ama-se alguém. Por muito longe, por muito difícil, por muito desesperadamente. O coração guarda o que se nos escapa das mãos. E durante o dia e durante a vida, quando não esta lá quem se ama, não é ela que nos acompanha - é o nosso amor, o amor que se lhe tem.
Não é para perceber. É sinal de amor puro não se perceber, amar e não se ter, querer e não guardar a esperança, doer sem ficar magoado, viver sozinho, triste, mas mais acompanhado de quem vive feliz. Não se pode ceder. Não se pode resistir.
A vida é uma coisa, o amor é outra. A vida dura a vida inteira, o amor não.
Só um mundo de amor pode durar a vida inteira. E valê-la também.”
- Miguel Esteves Cardoso

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