domingo, 7 de fevereiro de 2010

Solitária por opção...É isso que eu sou: solidão e solidariedade



Hoje venho falar de solidão...

Sei que parecerá um tema um tanto estranho, mas quando me perguntam tantas vezes porque opto por estar só, isto que aqui vos deixo, é o que me apetece dizer, contudo, na maior parte das vezes, o que conseguem de mim é o silêncio.

Pergunto-me porque parecerá tão estranho querer estar sozinho? Nietzsche uma vez escreveu acerca da educação: "Paulatinamente esclareceu-se, para mim, a mais comum deficiência de nosso tipo de formação e educação: ninguém aprende, ninguém aspira, ninguém ensina - a suportar a solidão." Se calhar, por este facto, dói à maioria de vós estarem sós... porque aprendemos a ser dependentes de alguém, aprendemos que devemos procurar nos outros aquilo que nos faz falta, que nos preenche... Mas deixem que vos diga: quem não souber viver em solidão jamais compreenderá a liberdade... estar só é ser livre para se fazer o que se quiser, quando se quiser. É quando, efectivamente, sentimos aquilo que somos! Muitos julgarão que a solidão é algo de mau, mas é, na verdade, uma fonte de tranquilidade, de felicidade... Estar com os outros impele-nos, de uma forma ou de outra, para o dano, acabamos, invariavelmente, por nos magoar, por nos decepcionarmos... por isso, prefiro estar só, comigo mesma, a ter de estar com os outros e dar-lhes a possibilidade de me magoarem!

Alguns pensarão no amor e na falta que faz termos uma pessoa ao nosso lado para partilharmos esse amor. É claro que o amor é uma coisa diferente e é óbvio que todos nós precisamos dele, mas se pararmos para reflectir um pouco, quando se opta pelo amor, pela companhia de um outro ser que, julgamos nós, nos possa preencher, estamos a abrir mão da nossa solidão, estamos a dar de nós aquilo que é o nosso maior tesouro, o que mais próximo temos da verdadeira liberdade!
Eugénio de Andrade diz, no Rosto Precário : "A solidão não é forçosamente negativa, pelo contrário, até me parece um privilégio. Talvez a minha solidão seja excessiva, mas eu detestei sempre as coisas mundanas. Estar com as pessoas apenas para gastar as horas é-me insuportável."

Ao optar por estar só, faço-o conscientemente! Certo dia li no livro "Arte da Respiração" que :
"Nem todos os que se refugiam na nulidade ou na solidão o fazem por cansaço e desistência das provas do mundo. Há também quem se afaste para evitar a baba e o louvor dos cretinos."

Durante muito tempo pensei, e depois de alguns relacionamentos, que era à solidão que eu tentava escapar, depois, com a maturidade, descobri que o que acontecia, na verdade, era que eu tentava escapar de mim mesma.
Sei que muitos ficarão perplexos ao ver-me optar por estar sozinha, afinal estar só, parece só fazer sentido em duas fases da nossa vida: quando se é jovem e temos toda uma vida pela frente, e uma imensidão de opções, ou quando se é velho demais e olhamos para o passado, que guardamos na nossa memória.
Ser solitário quando ainda estamos a meio do caminho é algo estranho, no mínimo pouco comum, pois todos estamos sempre à procura de algo...Mas eu já nada procuro, tudo aquilo de que preciso descobri que está dentro de mim!

Tenho pena de só o ter descoberto recentemente e isso fez com que eu ganhasse alguns medos, algumas cicatrizes... e como o poderia ter evitado, tivesse sido eu mais persistente... Mas o ser humano é fraco e cede às tentações!

A solidão não é mais do que nos envolvermos no casulo da nossa alma, fazermo-nos crisálida e aguardarmos a metamorfose, porque ela acaba sempre por chegar! (Uma vez mais a borboleta... Peço desculpa, mas julgo que vou sempre reportar-me a ela em tudo o que escreva...)

Não julguem, porém, que ao optar por estar sozinha eu não tenha uma mão cheia de pessoas que habitam a minha alma... Não haveria solidão mais triste do que a de um ser sem amizades. Não podemos passar sem a Amizade. A falta de amigos faz com que o mundo pareça um deserto, mas a nossa vida é, na verdade, um perfeito deserto. Apenas o vamos preenchendo com todas as coisas que nos dão algum prazer, seja a escrita, a música, a leitura, a fotografia, os amigos, esses seres maravilhosos que estão sempre por perto, atentos ao que se está a passar connosco e que nos estendem a mão quando é verdadeiramente necessário, mas que nos deixam respirar e respeitam quando queremos estar no nosso cantinho!

Por tudo isto, considero que a minha solidão será aquilo a que chamamos de uma "solidão moderada", bastar-me-ia abrir a porta e deixar entrar o que realmente quisesse! Tudo está lá, à minha espera, à espera desse gesto!
Paul Valéry disse que: "Há momentos infelizes em que a solidão e o silêncio se tornam meios de liberdade." E é sem dúvida nas agruras da vida que paramos para reflectir e a reflexão exige solidão. Depois chegam as costumeiras questões, o que deveria ter feito e não fiz, o que fiz e não deveria ter feito, onde errei, onde errou o outro...

Se pensarmos nos "Grandes homens", compositores, artistas, escritores, verificamos que estão muitas vezes solitários. Mas essa solidão é parte da sua capacidade de criar. Alguém disse, um dia, perdoem-me mas já não consigo encontrar a referência que "O carácter, assim como a fotografia, desenvolve-se no escuro!"

Claro que também poderíamos divagar sobre uma outra espécie de solidão, aquela em que o solitário é um abandonado. Felizmente não sei o que isso é, mas conheço quem o seja. Cada um de nós trilha o caminho que escolheu, a isso se chama: livre arbítrio, o problema é que essa solidão dói... Mas cada um de nós é que escolhe aquilo que quer para si, dizem que a vida é como um Eco, e que se não estivermos a gostar daquilo que estivermos a receber é porque devemos prestar mais atenção ao que estamos a enviar... pois a vida só nos devolve aquilo que nós dermos de nós. E nunca se esqueçam: Tudo o que derem de si, receberão em dobro (bom ou mau).
Existe ainda um outro tipo de solidão, aquela em que alguém é solitário porque os outros ainda não se juntaram a ele! É preciso cativarmos as pessoas e sermos responsáveis por aquilo que cativamos ou terminaremos, irremediavelmente, sós! Malraux diz que: "Quem não souber povoar a sua solidão, também não conseguirá isolar-se entre a gente."

"A solidão é o preço que temos de pagar por termos nascido neste período moderno, tão cheio de liberdade, de independência e do nosso próprio egoísmo." Natsume, in "Pobre Coração dos Homens". Não vos quero mentir... por vezes é difícil suportar a solidão, especialmente quando, por exemplo, consigo tirar uma fotografia e fico satisfeita com o resultado, aí e só aí, nesse momento específico, é que me sinto um pouco triste, porque o belo precisa ser partilhado para sê-lo, efectivamente. Porém, e olhando para as coisas sob uma perspectiva mais colorida, sinto que é apaixonante ver como o trabalho que vou realizando em solidão, se transforma, na maior parte das vezes, numa experiência partilhada com muitíssimas pessoas que convergem num mesmo ponto, aqui, nas páginas que tenho em alguns sítios, no Olhares... e então, sinto que já não estou só, outra vez.

A solidão não é algo que se encontre... é algo que fabricamos quando precisamos de estar com esse alguém muito especial: nós próprios!

Hoje estou acompanhada pela poesia... Nietzsche diz que: "quando se vive só, não se fala muito alto, não se escreve também muito alto: receia-se o eco [aquele de que vos falei...] o vazio do eco, a crítica da ninfa Eco. A solidão modifica as vozes." E então, em voz baixa, partilho convosco este poema, que adoro e com o qual me identifico.

Uma última palavra: Não se esqueçam nunca de que jamais haverá dois tempos iguais de solidão... porque nunca estamos sozinhos da mesma maneira!

Despedida

Por mim, e por vós, e por mais aquilo
que está onde as outras coisas nunca estão
deixo o mar bravo e o céu tranquilo:
quero solidão.
Meu caminho é sem marcos nem paisagens.
E como o conheces ? - me perguntarão. -
Por não ter palavras, por não ter imagem.
Nenhum inimigo e nenhum irmão.
Que procuras ?
Tudo.
Que desejas ?
Nada.
Viajo sozinha com o meu coração.
Não ando perdida, mas desencontrada.
Levo o meu rumo na minha mão.
A memória voou da minha fronte.
Voou meu amor, minha imaginação ...
Talvez eu morra antes do horizonte.
Memória, amor e o resto onde estarão?
Deixo aqui meu corpo, entre o sol e a terra.
(Beijo-te, corpo meu, todo desilusão !
Estandarte triste de uma estranha guerra ... )
Quero solidão.

Cecília Meireles

Um beijo de mel

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